"Não, não tenho vergonha de ser
esquizofrênico. Mas também não posso dizer que é fácil lidar com o
preconceito." Fonte Boletim de Fausto Figueira
Secretária de Saúde estadual emite “Carteira de Esquizofrenia"
Fausto Figueira, deputado estadual do PT, quer ação do Ministério
Público contra “Carteira de Esquizofrênico”A utilização de uma
carteira, emitida pela Secretaria de Saúde do Estado, por pacientes dos
serviços de atendimento à saúde mental, com a palavra “esquizofrenia”
estampada em letras graúdas, levou o deputado
estadual Fausto
Figueira (PT) a pedir providências ao promotor de Direitos Humanos na
área de Saúde Pública, Arthur Pinto Filho, contra o que considera uma
discriminação de inspiração nazista.Segundo o deputado, o
secretário da Saúde, Luiz Roberto Barradas Barata, “é o gestor da saúde
pública no Estado de São Paulo, e tem o dever de impedir que pacientes
sejam discriminados, notadamente o doente
mental.” A denúncia partiu
de um paciente, autor da carta “A Esquizofrenia e a Estrela de David”,
encaminhada à Comissão de Saúde da Assembléia Legislativa do Estado de
São Paulo, presidida por Figueira. Na mensagem,
o paciente diz que
no dia 20 de abril, ao retirar o medicamento do qual faz uso na
Farmácia de Medicamentos Especializados, em Santos, gerenciada pela
Cruzada Bandeirante São Camilo, sob os auspícios da Secretaria de Saúde
do Estado de São Paulo, recebeu uma carteira amarela com a palavra
“esquizofrenia” estampada em letras graúdas.
O paciente,
sentindo-se discriminado, equiparou a carteira recebida ao período
nazista e argumentou que a carteira afronta a Lei 10.216 (chamada Lei
Paulo Delgado), pois quebra do sigilo do diagnóstico estabelecido em
prontuário. “Sabe-se – diz o deputado na justificativa da sua
representação – que o estigma traz problemas (..) como a exclusão do
individuo com doença mental nas suas relações sociais. (…) As doenças
mentais devem ser
encaradas do mesmo modo que as doenças físicas.
Tal como o câncer e as doenças de coração, sabe-se que muitas doenças
mentais têm causas definidas, requerendo cuidados e tratamento
específicos. Quando os cuidados e o tratamento são prestados, é de
esperar uma melhoria ou recuperação, permitindo às pessoas regressarem
à comunidade e retomarem vidas normais. Infelizmente, os preconceitos
impedem que as pessoas,
uma vez recuperadas ou tratadas, consigam dar os passos para reingressar na vida familiar e social, com total plenitude.”
Segundo
Figueira, “a ‘Carteira do Esquizofrênico’, assim denominada pela
denúncia do paciente discriminado, também contraria a Declaração de
Direitos do Deficiente Mental, da Organização das Nações Unidas e a
própria
Constituição Federal, merecendo ser repudiada”. Abaixo, a íntegra da
carta do paciente encaminhada à Comissão de Saúde e Higiene da
Assembleia Legislativa:
"A Esquizofrenia e a Estrela de David
Em
1938, a chamada “Noite dos Cristais” marca o início da perseguição aos
judeus na Alemanha e na Áustria. Posteriormente, os judeus são
confinados em bairros determinados e obrigados a andar com a estrela de
David estampada em papelete amarelo e pregada junto a roupa, de forma
que fossem facilmente identificados.
“Esse segregacionismo também é
estendido aos ciganos, comunistas, homossexuais e, inclusive, aos
doentes mentais. A Alemanha de Hitler exterminou e perseguiu milhões de
pessoas, constituindo-se como uma das mais horrendas e vergonhosas
páginas da história do Homem. Infelizmente o preconceito e perseguição
às minorias chegam até os nossos dias, seja pelo viés das piadas e
comentários de gosto duvidoso, seja por grupos organizados como os
‘skinheads’.
“Em 20 de abril de 2010, ao retirar o medicamento do
qual faço uso na Farmácia de Medicamentos Especializados, em Santos,
gerenciada agora pela Cruzada Bandeirante São Camilo, sob os auspícios
da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, recebo uma carteira
amarela com enormes carimbos estampados: ESQUIZOFRENIA.
“Confesso
que num primeiro momento a única coisa em que pensei foi que havia em
minha testa uma tatuagem, um carimbo com meu diagnóstico estampado para
que todos pudessem apontar e dizer: ‘Lá vai o esquizofrênico’. Teria
sido apenas um ‘ato falho’ da burocracia? Quem sabe uma ação
inconsciente do recém-admitido gestor da farmácia? Ou seria, então, uma
política pensada e planejada para expor e reafirmar o estigma das
pessoas?
“A Lei 10.216 (chamada Lei Paulo Delgado), assim como
outras leis específicas da legislação médica, é ferida frontalmente na
medida em que o sigilo do diagnóstico estabelecido em prontuário médico
é, escancaradamente e em letras garrafais, divulgado. A Carteira do
Esquizofrênico, nesse sentido, é uma afronta ao bom senso. Mais do que
isso, é ilegal, dissemina o preconceito, ofende a ética e, sobretudo,
causa revolta.
“Todo o trabalho, treinamento, aprimoramento,
debates, documentos, fóruns, leis promulgadas, etc., é jogado por terra
por atos que denotam a verdadeira face de governantes descomprometidos
com os avanços conquistados pelas lutas dos doentes mentais. A Carteira
do Esquizofrênico mostra a verdade, ela rotula nossas misérias para
calar a nossa voz. Um governo que se nega a convocar a Conferência
Estadual de Saúde Mental; que pouca importância dá à Saúde Mental de
nosso município; que sucateou os serviços do Hospital Guilherme Álvaro
para entregá-lo à iniciativa privada; que sucateou a antiga Farmácia de
Medicamentos de Alto Custo para mais uma vez entregar um serviço
público à iniciativa privada e que, em conjunto com a Prefeitura
Municipal de Santos, vem precarizando os NAPS, só poderia mesmo mostrar
todo o seu pensamento em
relação a nós, usuários dos serviços, num ‘ato falho’: a ‘Carteira de Louco’.
“A
burocracia burra e mal intencionada é um dos braços desta máquina de
estigmatização. Primeiros os loucos, depois os pobres, depois os
negros, e assim por diante, até que todas as vozes contrárias sejam
suprimidas.
“O passo seguinte ao de retirar a nossa voz é nos
colocar novamente nos manicômios (ou nos trinta novíssimos leitos
psiquiátricos recém-abertos pela Cruzada Bandeirante São Camilo) e,
retrocedendo ainda mais, aplicar-nos castigos como o eletrochoque, a
solitária e outros métodos sádicos, que brotam na mente dos que
administram as instituições desse caráter, chegando, por fim, à tão
sonhada volta da lobotomia, em que o Estado poderia estar livre de
despesas e questionamentos.
“Não, não tenho vergonha de ser
esquizofrênico. Mas também não posso dizer que é fácil lidar com o
preconceito. Por todos os lugares onde tento fazer valer a minha
cidadania, logo vem a taxação: é louco! Também não é raiva o que sinto,
nem indignação. É um sentimento de impotência frente a esta máquina tão
poderosa que fatalmente irá desconsiderar meu desabafo com apenas um
argumento: “é louco”. E isto é o
que faz minhas pernas e meu corpo fraquejarem, mas parafraseando Cazuza no final de sua vida, morro atirando.”
É brincadeira heinnnnnn!
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